Sob direção musical de Marcelo Galter, artista revolve águas profundas em disco ancorado na Bahia, porto inicial da espiritualidade trazida da África. Ilessi lança hoje, 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, o álbum “Atlântico negro”
João Atala com arte de Julio Dui
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Atlântico negro
Artista: Ilessi
Cotação: ★ ★ ★ ★ ★
♪ “Lá vem o navio negreiro / Chegando na Bahia”, anuncia Ilessi no verso inicial da música, Navio negreiro (Luizinho do Jêje, Nem Cardoso e Peu Meurray), que abre o sexto álbum da cantora e compositora carioca, Atlântico negro.
Com título que reproduz o nome do livro lançado em 2012 sociólogo inglês Paul Gilroy, o álbum Atlântico negro aporta hoje, 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, com exuberante carga de ancestralidade afro-brasileira.
Navio negreiro, a faixa inicial, carrega “um barco cheio de Xangô” ao ancorar na Bahia, porto fundamental de rota que refaz o percurso da diáspora africana rumo ao Brasil. Esse porto é o motor que guia o disco-barco.
A direção musical e os arranjos do pianista baiano Marcelo Galter potencializam no álbum Atlântico negro a refinada musicalidade de Ilessi.
Gerada no fim de 2022 em afro-jam session na casa carioca Audio Rebel, mas registrada no estúdio, a travessia polirrítmica do álbum Atlântico negro é iluminada pela lembrança de Trastevere (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos, 1975), música emendada na costura do disco com Cobra coral (Marcelo Galter), tema jazzístico que se desenrola com a liberdade que pauta o álbum editado pela gravadora Rocinante.
Mixando emoção e improvisação, Atlântico negro transita por temas autorais de Ilessi – Ávida e Nonada, parcerias com Iara Rennó e Daniel Medina, respectivamente, além de Omulu e de Seca tatu, composições da lavra solitária da artista – em ambiência em que a beleza da sonoridade (calcada no piano de Galter) e a força da espiritualidade se impõem sobre a música, dando unidade ao álbum.
Destaque da safra autoral de Ilessi, Nonada ecoa o tom sacro embutido no cancioneiro de Milton Nascimento, compositor fundamental e (não por acaso) presente na seleção de Atlântico negro.
Criado sob direção artística da própria Ilessi, em parceria com Marcelo Galter e Sylvio Fraga, o álbum se alimenta da divindade dos orixás. Deus baiano da percussão, Luizinho do Jêje assina e embasa os temas Oxum (Ora ie ie ie) e Oxum (Oxum bai le ô), amalgamados por Ilessi na faixa que encerra o lado A da edição em LP do álbum Atlântico negro.
Temas tradicionais de Nego Fugido (manifestação cultural de Acupe, distrito do município baiano de Santo Amaro da Purificação), Cativeiro de Iaiá e Evém o Nego Paturi reaparecem unidos em medley que reitera que Atlântico negro revolve profundas águas passadas ao atracar na Bahia, primeiro porto da espiritualidade afro-brasileira.
Quando a viagem de Atlântico negro se encerra com Um baobá e eu (Sylvio Fraga, Marcelo Galter e Thiago Amud), a raiz de Ilessi está fincada em alto patamar com a ancestralidade viva de álbum que emerge como o lançamento fonográfico mais exuberante do Dia da Consciência Negra.
Fonte: G1 Entretenimento